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Necromancy Tales - Capítulo 1

Um pequeno feudo, com o povo vivendo na pobreza, mal conseguindo pagar suas despesas, pois eles precisam pagar tributos para os nobres que vivem em uma mansão na colina acima deles, eles trabalham manhã e tarde para fazer a vida crescer nestas terras, desde pequenos tendo seus corpos sendo forçados a se tornarem fortes, pois senão eles morreriam de fome.

Até mesmo suas ferramentas que utilizavam na lavoura e em outras produções não eram de fato deles, e sim do Barão que mora colina acima, pois como todos não possuíam dinheiro nem para comprar suas próprias ferramentas de trabalho, o Barão se considerava bondoso o suficiente de encomendar tais ferramentas para o ferreiro, e assim emprestá-las para seus servos, com um certo custo, mas nada significativo, tinha de ser um valor banal, pois senão os servos morreriam de fome.

Assim como também havia o serviço militar obrigatório, trabalho obrigatório nas terras do próprio barão, doação de suas produções, doação de mana… E recentemente eu descobri que existe até uma taxa para quem decide se casar com alguém de outro feudo.

 

Mas não importa o nível de absurdidades que ocorrem, as pessoas por aqui vivem com um sorriso no rosto, agradecendo a nossa deusa por estarem vivos e de possuírem uma barriga cheia e um teto sobre suas cabeças.

 

Ou pelo menos é o que eles querem que eu pense.

 

E é por isso que eu estou aqui, na lama, com os pés descalços, pois não queria sujar minhas sandálias floridas.

Eu saí de casa com uma cesta de alimentos que restaram do jantar de ontem.

 

—  Muito obrigada Selvia, nós aqui da vila somos realmente abençoados pela deusa por termos você aqui conosco.

— Ahaha… Não há de que dona Lewis, eu sei como é difícil para vocês aqui embaixo, então o mínimo que eu posso fazer são essas pequenas coisinhas.

 

Dito isso, eu entrego três pães e uma fatia de queijo para a dona Lewis, que agradece e continua em seu rumo.

 

Algumas crianças que estavam correndo brincando ao redor me avistam, e vem correndo até mim, espalhando lama conforme pisam, por sorte eu estou vestindo minha capa.

 

Dois garotos e uma garota, um deles com um dente faltando, a garota com sardas no rosto, e todos eles com um sorriso de orelha a orelha, completamente imundos.

 

— Ei ei mana! Você trouxe algum doce desta vez? - Um dos garotinhos me pergunta.

 

Eu faço um sorriso para eles.

 

— Claro que eu trouxe! Eu mesma os fiz para vocês e os outros, um pãozinho de geléia de morango para o Thomas, a pequena Hannah ganha um de limão, e para você Peter, que não gosta das geléias, uma tortinha com canela!

— Haha!

— Eba!

— O-obrigada...

 

Afinal, eu vim preparada.

 

Eu entrego cada pequeno docinho que eu fiz para o seu pequeno dono.

Muitos devem pensar que não deve fazer sentido alegrar as crianças assim, mas eu discordo, pois o conceito comum diz que se uma criança está feliz, então os seus pais estão felizes, é como acertar três coelhos com uma cajadada.

 

Tudo que me interessa são os sorrisos deles.

 

— Ei, mana Selvia! - disse Thomas, com a boca suja de geléia, chamando minha atenção.

— O que foi Thomas? - Respondi, com um sorriso, enquanto coloco uma mecha de cabelo para trás da minha orelha e me agacho levemente para vê-lo nos olhos.

 

Não posso esquecer de chamá-los pelo nome, isso gera familiaridade e os deixa feliz, olhar nos olhos também é importante, gera confiança.

 

— Você casa comigo quando eu crescer?

 

De novo, não é a primeira vez que me perguntam isso.

 

— Ora ora, você sabe que eu não posso, além de que eu já me tornei adulta semana passada, o meu pai está enviando cartas para várias pessoas para me arranjar um noivo.

 

Esse tipo de pergunta é delicada de responder, mas a verdade é sempre a melhor opção, só não posso esquecer de sorrir, sim.

 

— Aaahh… Mas você é tão gentil e bonita, se parece com uma princesa.

— Sim! Igual aquela princesa da história que você nos contou outro dia

— É... todos da vila gostam de você, eu queria ficar bonita igual você quando eu ficar maior.

 

Preciso responder aos sentimentos deles agora.

 

— Vocês todos são uns amores, agora se me derem licença, eu preciso terminar de entregar esta comida para todos.

— Tá bom!

 

..

.

 

Finalmente eu termino de entregar tudo, e retorno para casa no topo da colina, eu preciso retocar meu perfume, senão meu pai irá ficar irritado...

 

Como eu já estou em idade para casar, eu preciso usar um perfume floral para demonstrar isto a qualquer homem que esteja procurando uma esposa.

 

Que desgosto.

 

O meu pai sempre me disse que iria encontrar um cavalheiro bom para ser meu marido, mas eu sei que isso não existe neste mundo.

 

Assim que eu entro, uma das empregadas da casa vem até mim e me ajuda a tirar minha capa.

 

— Srta. Selvia! Olhe como os seus pés estão imundos! Você precisa limpá-los antes de entrar, por que não aproveita e toma um banho também? 

— Acho que vou aceitar a sua oferta, não pretendo mais sair de casa hoje além de ir até meu local de estudo.

 

O meu pai é um tolo.

 

No banheiro, eu estou me cobrindo com uma toalha enquanto espero a empregada terminar de encher a banheira com água morna através de um cristal mágico.

E pensar que usamos artigos que custam 10 peças de ouro sempre que vamos tomar banho, enquanto os servos lá embaixo possivelmente nunca viram uma moeda de ouro na vida.

 

É, eles me odeiam, com certeza.

 

— Você estava levando as sobras de comida para eles de novo não é, mestra?

 

Em resposta a pergunta, eu vou até a janela do banheiro, abro levemente a cortina para poder observar a vila e digo:

— Eles sofrem tanto lá embaixo, enquanto nós aqui nos regozijamos com os frutos de apenas termos nascido.

— De novo com esta conversa senhorita… Escuta, você e seus pais também são importantes, vocês tem a obrigação de proteger aqueles que os servem e garantir que eles sobrevivam neste mundo duro e cheio de monstros, o seu pai é um grande guerreiro e já protegeu esta vila diversas vezes, eu acho que vocês podem aproveitar uma vida um pouco melhor se for assim, todos aqui estão vivos por causa de vocês. - Respondeu a empregada.

 

Eu suspiro.

— Eu sei mas…

— Sem mas, agora venha aqui, terminei de preparar o seu banho, você é uma garota tão linda e boa, mas também é cheia desses pensamentos negativos, esqueça isso tudo um pouco.

 

Os meus problemas não se resumem em apenas aplacar a ira dos moradores da vila, não, eu preciso prestar ainda mais atenção aqui em casa, pois é aqui onde minha guarda está mais baixa.

Eu não me lembro de um único momento em minha vida em que realmente me senti segura ou em paz, muito menos livre.

 

Após terminar de me limpar e me vestir, finalmente posso ir descansar, depois de passar o dia protegendo minha vida.

 

Eu finalmente posso ir lá, meu local de descanso.

 

..

.

 

Após passar no meu quarto e pegar um livro na minha estante de livros, eu saio até o quintal de casa, onde há uma estrutura cheia de detalhes artísticos feita de pedra, que dentro dela há apenas uma escadaria para baixo.

Com um lampião em uma mão e um livro na outra, eu desço as escadas e me vejo em uma sala, rodeada com os sarcófagos de pedra de meus ancestrais.

 

E no centro da sala há uma mesa de madeira e uma cadeira simples contrastando o ambiente mórbido e sedoso, devido às teias das aranhas.

 

O mausoléu de minha família é o único lugar em que eu consigo relaxar.

 

É um local onde há pessoas com as quais eu não preciso me preocupar, ou conversar, e nem interagir, se eu quisesse, poderia até amarrar algumas linhas neles e movê-las, tornando-os marionetes, e eles nem iriam reclamar, afinal estão mortos.

 

Eu poderia fazer o que eu quisesse com os mortos

 

Os mortos não podem me machucar.

Não podem me acordar no meio da noite com uma faca em meu peito.

Não podem envenenar minha bebida.

Não podem utilizar minha beleza para se satisfazerem.

Não podem me manipular com palavras falsas.

Os mortos… São tão bons, por que eles não podem ser mais parecidos com os vivos?

 

Esta é uma linha de raciocínio interessante minha jovem.

 

Tem alguém aqui dentro? Não, ninguém vem até aqui além de mim, e a voz… Não pareceu ter vindo de algum lugar, e sim de dentro da minha cabeça.

 

Precisamente, por que não vem até mim para podermos conversar melhor? Pois é raro encontrar alguém com tal mente como a sua.

 

Você… Leu minha mente? Os meus pensamentos?

 

Sim, e eu posso lhe dar isto que você deseja, sem palavras falsas, sem lhe manipular… Talvez só um pouquinho.

 

Meus instintos gritam para eu não o procurar, porém está claro que ele sabe o que eu penso, e desejo.

 

O sarcófago à sua esquerda, Andrew Islar.

 

Antes que eu pudesse ir até lá, o meu corpo começou a se movimentar por conta própria, ele também anseia pela chance de ter paz e liberdade tanto quanto eu.

 

Eu abro o sarcófago.

 

Embaixo dos ossos.

 

Além do esqueleto de Andrew, havia uma certa areia cinza dentro do sarcófago e após enfiar a mão nela eu sinto algo.

 

Sua mão é bem macia.

 

E de dentro da areia eu retiro um livro.

Um livro de aparência bem incomum, com uma capa de couro repleta de rugas que formam um rosto, fazendo uma expressão que não consigo identificar se é de tristeza ou raiva, como se estivesse gritando algo inaudível, é um tanto perturbador.

 

Você adora livros, não? Por que não me abre? Veja o meu interior, os seus desejos estão todos dentro de mim.

 

Já que ele estava em minhas mãos eu o abri, suas páginas deterioradas eram feitas de um material levemente elástico, não era o pergaminho comum, era mais claro e possuía variações mais avermelhadas na cor enquanto algumas partes eram completamente manchadas de vermelho, tornando impossível de se ver os locais manchados.

 

E as palavras nele, eu não consigo lê-las, é uma língua muito antiga.

Mas entre as palavras haviam gravuras.

 

Os desenhos mostram pessoas, magos aparentemente.

 

Estes são os seus desejos.

 

Minha visão começa a ficar nublada, os desenhos ficam mais nítidos.

 

O conhecimento do proibido é extremamente satisfatório, não?

 

As imagens começam a se mover entre as páginas do livro.

Eu consigo ver os magos erguendo os mortos da terra e os controlando.

 

Você também pode fazer isto.

 

Eles estão juntos, lado a lado, os mortos obedecem os magos inquestionavelmente.

 

É o que eu desejo.

 

Este conhecimento, uma maneira de eu poder viver em paz, sem me preocupar com as pessoas.

 

Tudo o que eu preciso fazer, é continuar a ler este livr-

 

Eu o fecho.

 

Hã?

 

A minha visão volta ao normal.

 

Ei, espera.

 

Sabe, algo está me incomodando.

 

Não, não…

 

Este livro… Você estava manipulando meus pensamentos? Em algum momento, eu senti que meus pensamentos estavam se convergindo com as suas palavras.

 

Tch… E pensar que eu finalmente tinha arranjado um trouxa… E uma que se adequa aos meus gostos…

 

Perdão, o que disse?

 

Então você será a minha nova portadora…

 

Portadora?

 

Você quer aprender, não é? A magia que está em mim, Necromancia.

 

Pensando melhor, acho que…

 

Eu estou dentro da sua cabeça, você não consegue me enganar.

 

Eu inconscientemente desvio meu olhar do livro, querendo negar o que ele me disse.

 

O livro suspira.

 

Aparentemente eu não vou conseguir te dominar tão facilmente, por algum motivo minha insanidade não te afeta.

 

O tom de voz dele mudou, ele está mais relaxado.

Então você realmente queria me manipular, me fazer pensar que você pode me dar o que eu quero, e através de alguma magia dominar o meu corpo, é isso?

 

Ah, mas eu realmente posso te dar o que você quer, só não vai ser tão fácil quanto você pensa, magia não é fácil.

 

Eu não confio nele.

 

Mas, ele é minha única esperança, minha única esperança de viver uma vida ao invés de apodrecer neste buraco, eu não me importo de abandonar meu status e dinheiro, eu só quero sair daqui o mais rápido possível.

Principalmente agora, que muito em breve meu pai irá dar um baile para receber os meus pretendentes.

 

Eu posso não conseguir te controlar, mas pelo menos eu gostei de você, uma nobre cansada de uma vida cheia de mentiras, disposta a abandonar sua nascença para isto.

E que é uma garota jovem e bonita ao invés de um velho decadente e sarnento... Talvez não seja tão ruim assim.

 

Então, senhor livro… Como eu posso ter esta magia, essa… Necromancia?

 

Ah perdoe-me, eu não lhe disse meu nome ainda, você pode me chamar de Necronomicon.

E para você aprender esta profana e bela arte mágica, você precisa ir até lá, para a Academia Necromante.

Uma escola de magia justamente para isso? Parece perfeito demais para mim.

 

E você também precisa me dar seu... sangue… seu, delicioso… sangue… virgem… ehe… hehehe.

 

V-você precisa dizer isso desse jeito? Parecendo um velho tarado.

 

E-eu disse isso em voz alta?

 

Nós nunca estivemos conversando em voz alta.

 

Ah, merda...

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