top of page

Necromancy Tales - Capítulo 2

Eu trouxe o Necronomicon para o meu quarto, logo um dos guardas da mansão iria me buscar por causa do toque de recolher noturno, então ao invés de arriscar ser pega no flagra com um livro de magia negra, eu o coloquei por baixo das minhas roupas e voltei para o meu quarto.

 

O livro ficou estranhamente agradecido por isso.

 

Eu me certifico de trancar a porta do quarto e sento em minha cama, e logo em seguida puxo o Necronomicon pela gola de minha camisola.

 

Eu o seguro com ambas as mãos enquanto encaro aquela capa de couro desconcertante dele, cujas dobras do couro formam um rosto desfigurado, cuja expressão se assemelha a um grito de dor.

 

Está ponderando se irá arrepender-se?

 

— Não, eu já me decidi, estou só me preparando mentalmente, não é uma decisão fácil de se cumprir, largar minha nobreza para viver como uma criminosa.

 

Eu até poderia concordar dizendo que eu te entendo, mas aí eu estaria mentindo.

 

— Muito obrigada pelas palavras de conforto.

 

Disponha, mas você tem um punhal neste quarto?

 

— Ah, claro… O sangue.

 

Bem, não é como uma nobre dama tivesse um no quarto, então por que não vai até a coz-

 

Eu enfio a mão embaixo do meu travesseiro e de lá retiro uma adaga simples de esfola.

 

Por que você…

— Nunca se sabe quando alguém pode entrar no seu quarto a noite.

 

Mas você acha que conseguiria matar um assassino treinado com isso?

 

— Mas a faca não é para o assassino.

 

Há um pequeno momento de silêncio no quarto por alguns segundos.

 

...Bem … Que tal botar essa adaga para o propósito dela então?

 

A voz dele estava um pouco incomodada, mas temos coisas mais importantes a lidar no momento.

— Certo, o ritual… Me conte os detalhes.

 

Primeiro, você não vai conseguir se cortar se estiver me segurando, então me coloque no chão ou em alguma mesa.

 

Ainda sentada, eu coloco o Necronomicon na frente dos meus pés.

 

O ritual em si é bem simples, após a morte do meu último portador, a primeira pessoa de quem eu beber o sangue, se ela sobreviver após uma semana desde então, ela irá se tornar a minha portadora.

 

Assim que eu beber o seu sangue, eu também irei precisar tomar parte da sua alma em forma de uma das partes do seu corpo, e essa é a parte que deve ser um pouco incômoda para você.

 

— Em forma de uma das partes do meu corpo… então eu irei perder um braço ou algo do tipo?

 

Especificamente, um dos seus olhos.

 

Eu instintivamente fecho um dos meus olhos, para ter uma prévia de como seria viver sem um deles.

 

— Vai doer?

 

Uhm… Vou tentar ser rápido.

 

Eu respiro fundo.


 

— Eu já tive que passar por algumas sangrias de embelezamento, então não me preocupo de me cortar com a adaga, mas o olho… Eu consigo viver sem um deles, mas o processo de ter um olho arrancado é um pouco…

 

Se servir de consolo, o ritual irá cicatrizar a ferida assim que o olho for removido.

 

Ah sim, e caso você queira escolher qual olho irá ser removido, basta só fechar o olho que você queira manter quando derramar seu sangue em mim.

 

— Certo…

 

Eu fecho o meu olho direito, já que sou destra.

 

— Estou pronta.

 

Eu pego uma das pontas do lençol de seda da minha cama e o enrolo, deixando-o bem grosso, e mordo o lençol bem firme para suportar a dor do ritual.

 

Pego a adaga com uma mão, e com a outra mão, eu aperto a lâmina.

 

E corto a palma da minha mão, eu imediatamente sinto a dor ardente do corte, mas eu resisto a dor e fecho a mão, apertando a ferida.

 

O sangue começa a escorrer e a formar uma gota embaixo do meu punho.

 

E o sangue cai… No chão.

 

Selvia, você não poderia mirar melhor não?

 

Eu cuspo o lençol da minha boca

— Eu estou com um dos meus olhos fechados! Ainda não me acostumei com a minha visão as-

 

E enquanto eu reclamo, a próxima gota cai no Necronomicon.

 

Instantaneamente eu sinto um pulso de dor em meu olho e me contorço de dor.

 

— GAH…!

 

Rapidamente largo a adaga e coloco o lençol na boca para evitar gritar com a dor.

 

— HNNNGG…!!!!!

 

Eu não consigo ver direito, mas parece que meu olho foi para frente por conta própria, mas ainda está preso em alguma coisa no meu corpo.

 

Eu não estou sentindo dor por causa do olho estar fora do lugar que ele deveria estar, é apenas um desconforto, mas a dor de cabeça está insuportável, e eu continuo a gritar enquanto mordo o lençol.

 

Até que eu sinto um corte, alguma coisa cortou o que estava prendendo o meu olho ao meu corpo, e minha visão se vai.

Mesmo estando com o olho aberto, eu não enxergo nada, parece que meu olho se foi.

 

E o desconforto que eu sentia antes agora se tornou uma sensação de queimadura, algo está cauterizando a ferida do meu olho.

 

Neste ponto eu estou deitada na cama, rolando e me contorcendo de dor enquanto mordo o lençol, com ambas as mãos no meu rosto, eu consigo sentir o sangue quente da minha mão se espalhando pelas minhas bochechas e testa.

 

Eu não consigo ver o que está acontecendo com o Necronomicon, ele está totalmente silencioso, não sei se ele simplesmente não está falando ou se não consigo ouví-lo, mas isso fica para depois, preciso me concentrar em suportar esta dor.

 

..

.

 

5 minutos agonizantes se passaram, a dor diminuiu e agora está apenas desconfortável, eu me sento e suspiro profundamente.

 

Eu abro o meu olho que restou.

 

Eu vejo o Necronomicon no chão, a cor dele está diferente, é como se estivesse revitalizado, o couro de sua capa que antes estava desbotado, agora está mais avermelhado, e embaixo dele está um pentagrama repleto de símbolos que só posso compreender como mágicos, junto da mancha de sangue no chão, da gota que errei.

 

Minha visão ainda está um pouco turva, mas parece que as coisas se acalmaram.

 

Eu sinto uma pequena brisa gelada no buraco de meu olho que foi removido, é um tanto desconfortável sentir o vento gelado entrando no meu crânio, agora entendo o verdadeiro motivo das pessoas usarem tapa-olhos.

 

Está se sentindo melhor?

 

A voz do Necronomicon retorna para os meus pensamentos.

 

— Sim, a dor ainda está latejando, mas é suportável.

 

Hm, é bom que você tenha uma certa tolerância a dor, se você for usar a minha magia, será necessário fazer algo parecido mais vezes.

 

— Mas eu só tenho um olho restante.

 

As próximas vezes não serão tão drásticas assim, os feitiços mais comuns irão requerer apenas o seu sangue, e as vezes o sangue de outras pessoas também.

Você não tem problemas com isso, certo?

 

— Em derramar o meu sangue? Eu acabei de sacrificar o meu olho.

 

Não o seu, mas dos outros.

 

— Por que eu deveria me preocupar com isso?

 

É... você é digna de ser minha Portadora mesmo.

 

Logo em seguida, uma corrente se materializa ao redor da minha cintura, e outra também se materializa, esta segunda corrente conecta o Necronomicon com a corrente ao redor de minha cintura, e ele começa a flutuar diante de mim.

 

Certo, agora você é oficialmente a minha Portadora, isso significa que você não irá sofrer tantos efeitos colaterais quando me utilizar… E que agora você é a única que pode se comunicar comigo a distância.

 

— Eu posso tirar essa corrente? É um tanto inconveniente, principalmente quando trocar de roupa.

 

Eu gostaria de falar que não, mas… Sim, você pode.

 

— Ótimo.

 

Eu puxo o Necronomicon, esticando a corrente, e ela magicamente desaparece, e logo em seguida eu o enfio dentro de uma gaveta da minha mesa de maquiagem e a fecho.

 

Espera aí, mas o que você está fazendo?

 

— Preciso me trocar, não podemos ir embora comigo de pijama, não?

 

Você não está apressando demais as coisas? Nós acabamos de firmar o pacto.

 

— O meu pai deve voltar com um pretendente a qualquer dia, inclusive amanhã, e se isso acontecer eu não terei como recusar.

 

..

.

 

Roupas leves simples, botas para a estrada e um manto marrom para me esconder, roupa básica de viagem que ninguém irá suspeitar que eu sou uma nobre, não quero ser alvejada por pessoas mal intencionadas.

 

Um cinto com um punhal, e nas costas um saco com mantimentos e dinheiro para a viagem.

 

E falando na viagem…

 

Eu abro a gaveta onde o Necronomicon está.

 

— Terminou de se arrumar? - Ele diz, um tanto emburrado, desta vez com a própria voz dele, sem estar se comunicando diretamente pelos meus pensamentos.

 

— Eu acabei de perceber, mas o quão longe é a Academia Necromante?

 

Os olhos na capa do Necronomicon desviam o olhar de mim, aparentemente ele pode fazer expressões faciais agora.

 

— ...Não sei. - Ele diz, enquanto eu o coloco na minha cintura, o que faz as correntes surgirem novamente, prendendo-o a um cinto de correntes.

 

Eu suspiro, um tanto incomodada.

Mesmo que ele não saiba o quão longe é, suponho que ele tenha uma maneira de encontrar o lugar.

 

— E como vamos chegar lá então?

 

— Eu... Consigo sentir a alma da minha antiga portadora, eu posso apontar a direção...

 

Eu não sinto muita firmeza nas palavras dele

 

— Certo, e em qual direção você sente que ela está?

 

— Do leste… Um pouco para o sul, mas não a ponto de ser o sudeste.

 

Pelo menos ele parece estar certo da direção.

Leste… O território do meu pai já é ao leste do reino, e ao leste daqui tem duas vilas e uma pequena cidade, Timbervale… Talvez eu deveria ir até lá como um começo, mas antes devo passar na vila de Lindisfarne.

 

— Bem, é um plano, ao chegarmos em Timbervale devemos ter uma localização mais precisa de onde está a academia.

 

— Certo, então só nos resta sair daqui, já que estamos um tanto afastados do centro do reino, o meu pai é um tanto relaxado na segurança daqui, então os guardas só ficam fora da mansão.

 

Eu vou até o meu armário e o abro.

 

— E o melhor jeito para sairmos da mansão sem sermos vistos, é pelo meu quarto.

 

— Mas o seu quarto fica no segundo andar, não é como você guardasse uma-

 

E vasculhando no armário, eu puxo uma corda de dentro dele.

 

— … corda.

 

— O que? Nunca se sabe quando vou precisar fugir de casa quando uma das empregadas finalmente decidir me matar.

 

— Depois do punhal, não sei o motivo da minha surpresa também.

 

Não demora muito para eu amarrar a corda na minha cama, mas eu tenho certa dificuldade em descer pela janela, pois não sou muito atlética.

 

Como eu conheço a ronda dos guardas noturnos eu sei onde e quando os guardas irão estar, logo passar por eles despercebida não é muito difícil.

 

Mas temos um problema.

 

Estou nos estábulos, parada diante de um dos cavalos do meu pai, o cavalo está em pé e me encarando, e eu o estou encarando de volta.

 

— Esqueci de como iríamos sair daqui com um cavalo sem sermos vistos.

 

— É, um cavalo não é algo pequeno, sem falar no som dos cascos dele.

 

O cavalo da uma leve bufada no meu rosto, e eu sinto um pouco de saliva cair na minha bochecha.

 

— Se eu tentar sair correndo o mais rápido que eu posso, eu posso despistar os guardas pela noite, duvido que com a quantia que eles recebem eles iriam tentar ir atrás de mim. — Eu falo, enquanto esfrego a saliva da minha bochecha com uma das mãos. — Mas assim que meu pai voltar pela manhã, ele irão atrás de mim, eu queria que eles não percebessem que sumi por mais tempo.

 

— Bem, assim que uma das empregadas vier te acordar pela manhã eles vão acabar sabendo de qualquer jeito, não?

 

— É, você está certo…

Com a porta do estábulo já aberta e o cavalo selado, eu dou um suspiro.

 

— EIYAAH! - Eu grito, balançando as rédeas.

E o cavalo dispara.

 

Os poucos guardas que estavam patrulhando ao redor da mansão percebem a comoção e vem verificar o que está acontecendo.

 

E como eu estou com o rosto coberto com o capuz do manto, pelo ponto de vista deles eu sou apenas um ladrão de cavalos aleatório.

 

Os guardas não querem apontar as lanças contra mim pra não machucar o cavalo do meu pai, e também se ficarem na minha frente eles serão atropelados.

Embora tenha sido um alvoroço, eu consigo passar pelos portões da mansão facilmente.

 

E eu continuo correndo a toda velocidade até o cavalo se cansar, mesmo já estarmos a uma certa distância da vila, está de noite, e eu quero chegar em Lindisfarne o mais rápido possível.

 

E durante todo esse tempo, o Necronomicon que estava preso a minha cintura pela corrente, estava balançando devido aos galopes do cavalo.

 

E ele encosta no cavalo.

 

O cavalo solta um relincho alto e cai no chão.

 

E como eu estava montada nele, eu vôo para frente, caindo com o rosto na lama.

— Ugh… - Eu solto um gemido de dor, sinto que arranhei o rosto com alguma coisa, e o meu olho… Ou melhor, a falta de um olho, voltou a doer.

Além de que eu sinto um pouco de terra se esfregar no buraco do meu olho, realmente acho que preciso de um tapa olho, mas é algo tão feio…

 

O cavalo…!

 

Deixando meus devaneios de lado, eu me viro, ainda caída na lama, e eu vejo o cavalo caído no chão, se debatendo.

 

E repentinamente, o cavalo começa a sangrar por todos os seus orifícios... Olhos, boca, ferimentos, narinas e outros.

 

O sangue drenado flui diretamente para o Necronomicon.

 

Eu olho para o Necronomicon.

Ele olha para mim.

 

— Bem, só tem um jeito de isso ficar pior.

 

Começa a chover.

© 2020 Portfólio Pedro Prass - Criado por Me. Designer Adriano Monteiro via plataforma Wix.

  • Facebook Black Round
  • Instagram - Black Circle
  • Twitter Black Round
bottom of page